O que têm em comum um dos maiores grupos, a nível mundial, de vestuário, calçado e acessórios de desporto, uma loja de brinquedos e um dos líderes europeus na venda de electrodomésticos e electrónica de consumo? A noção que o cliente é o derradeiro árbito na disputa pelas vendas.
Estas três empresas seguem uma filosofia de "viver para servir o cliente". A ideia foi verbalizada no World Retail Congress por Michael Stanier, COO e responsável de Consumer-Direct Markets do grupo Adidas, que opera num modelo de distribuição híbrido. 22% da sua actividade é retalho, mas em 2015, considerando o franchising e as lojas próprias, será 50%.
Em 30 anos de experiência no retalho, onde figuram no currículo passagens por empresas como a Marks & Spencer, Timberland, entre outras, este responsável aprendeu que organizacionalmente as empresas pensam mal o serviço prestado ao cliente. “Subestimam a importância de quem lhes paga o salário”, nas suas próprias palavras e acrescentou que “a liderança tem de criar uma cultura organizacional centrada no cliente. Há um desequilíbrio entre a importância que se atribui à sede e à loja. A liderança tem de ser mais humilde para com as pessoas que estão na plataforma de vendas, normalmente com vencimentos abaixo dos seus, mas que são quem fala com os clientes”, considerou.
O sucesso conduz a escolhas sobre que caminhos se devem seguir, as mesmas que cabem ao consumidor, razão pela qual o retalho tem tanto de ciência como de arte. “O retalho é uma ciência na gestão, na cadeia de abastecimento, no controlo do inventário, por exemplo, mas para servir os clientes nos dias de hoje é preciso arte. O cliente dá ao retalho a permissão de dialogar com ele, se a sua execução não tiver falhas. É aqui que entra a criatividade, na construção do diálogo através de eventos, do recurso a celebridades, à música, etc. A conversão do consumidor em cliente faz-se através de uma interacção criativa com ele”, concluiu o COO da Adidas.
Já para Gudjon Reynisson, CEO da Hamleys, o serviço ao cliente é uma obsessão, na medida em que o que se vende nas suas lojas não é diferente do que a concorrência comercializa. Logo é a experiência proporcionada que diferencia os operadores. “Há mais de 250 anos que esta é a filosofia da Hamleys. William Hamley queria que as crianças pudessem ter todos os brinquedos do mundo numa loja e pudessem brincar com eles”, recuperou na sua apresentação.
Dentro de um período de cinco anos, a Hamleys quer expandir-se a nível internacional para alcançar uma rede total de 200 lojas em funcionamento. E o desafio vai ser conseguirproporcionar essa experiência de compra memorável em todos os locais. “O que torna a Hamleys especial é a sua equipa de vendas, a forma como interage com o cliente. Faz valer a regra que as lojas não são só um local onde se podem comprar produtos”, detalhou o responsável.
E nem a crise e a recessão são aspectos necessariamente maus, uma vez que ajudou o operador a focar-se no que realmente sabia fazer: proporcionar uma experiência de compra memorável. “Esta é a nossa melhor ferramenta de vendas. O segredo da Hamleys é que dá vida aos brinquedos, o que também beneficia as marcas que vende, porque os brinquedos não morrem numa prateleira de supermercado”.
Como em todos os negócios, trata-se de facturar e a Hamleys é uma máquina de vendas muito organizada, com uma gestão muito apurada, derivada a custos operacionais muito elevados.
Por sua vez, Regis Schulz, CEO da Darty, explicou que a preocupação com o serviço ao cliente começa com a preocupação com a própria equipa, ao proporcionar-lhe as ferramentas necessárias para uma correcta realização das suas tarefas. “Os consumidores possuem e são conhecedores da mais recente tecnologia, logo os vendedores também têm de ter as ferramentas adequadas ao desempenho das suas tarefas”.
O CEO da Darty recuperou um exemplo prático em que passou uma tarde com o melhor vendedor de televisões da insígnia e verificou que este usava o seu iPhone e e-mail pessoais para demonstrar os produtos aos clientes. “É um contrassenso num retalhista que vende a mais recente tecnologia. Hoje todas as lojas têm Wi-Fi para poderem demonstrar a conetividade entre os produtos”, detalhou.
A gratificação dos clientes tem de ser instantânea. Este é um aspecto muito valorizado pelo CEO da Darty, que recorda que os serviços pós-venda estão à vista de todos e são feitos na própria loja. “70% das avarias podem ser reparadas na hora, por isso não faz sentido o cliente esperar duas semanas como é norma nos outros retalhistas”, reforçou.
Experiência de compra que tem de ser consistente da loja à web e da web à loja. Razão pela qual as lojas da marca têm comparadores de preços e ecrãs “touch screen” onde os consumidores podem consultar a disponibilidade de stock, a que se junta a possibilidade de, no serviço web, poder falar com um vendedor da loja através de uma chamada telefónica. “Os vendedores ganham comissão, mesmo que a venda tenha sido feita na Internet”.
Mas para se poder prestar estes níveis de serviços há certos aspectos a abdicar: “menos pessoas na sede, mais pessoas no contacto com o consumidor”, concluiu Regis Schulz.
* na imagem Regis Schulz, CEO da Darty