A 26 de Março deste ano, na Assembleia da República, o primeiro-ministro José Sócrates anunciava que o Governo ia baixar a taxa do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) para 20 por cento. A decisão surgia no mesmo dia em que o Instituto Nacional de Estatística divulgava que o défice orçamental de 2007 foi de 2,6 por cento do Produto Interno Bruto (PIB), “o valor mais baixo atingido na democracia portuguesa”, como José Sócrates fez questão de destacar. Este valor, conjugado com a redução da dívida pública em um ponto percentual do PIB, antecipando em um ano as previsões do Governo, levavam o Executivo a tomar a decisão de “aliviar” a carga fiscal dos portugueses.
A nova taxa entrou em vigor no passado dia 1 de Julho e incide sobre produtos que representam 80 por cento da receita total cobrada neste imposto. Mas, em alguns casos, a descida é tão marginal que mal se dá por ela. Para o Estado, são menos 250 milhões de euros até ao final do ano.
Segundo declarações de João Fernandes, economista do Finibanco ao Diário Económico, para ter alguma relevância, a descida do IVA teria de ser de três por cento.
O Diário Económico foi às compras, antes e depois da descida do IVA e contabilizou uma poupança de apenas 2,39 euros num cabaz que incluía comida, artigos de higiene, electrodomésticos, combustíveis, tecnologia, cultura e bens duradouros.
Os automóveis são dos artigos onde a redução do IVA mais se fará notar no preço final. As diferenças vão oscilar entre 100 e 200 euros, para automóveis com um preço final até pouco mais de 20 mil euros. Os combustíveis também descem 1,3 cêntimos na gasolina e 1,2 cêntimos no gasóleo, mas nas portagens só há descidas quando se atingem diferenças de pelo menos cinco cêntimos. Na A5 de Lisboa a Cascais, por exemplo, não muda nada.
As telecomunicações são um dos sectores onde os operadores vão fazer repercutir a descida do IVA no preço. Mas as diferenças também não são muito significativas para os bolsos dos consumidores. A título de exemplo, uma assinatura de televisão por cabo que custava 40 euros fica 33 cêntimos mais barata e numa factura de telefone de 25 euros poupa-se 21 cêntimos.
As principais despesas, como a alimentação e a habitação, vão ficar praticamente na mesma. Na ida ao supermercado é possível poupar, mas pouco, já que a maioria da alimentação tem uma taxa da cinco por cento, não abrangida pela descida. O crédito à habitação não reflecte a descida do IVA, tal como água, luz e gás natural.
Distribuição e banca ficam a ganhar
A distribuição e a banca são os sectores que, na opinião de Ricardo Valente, presidente da gestora de patrimónios Personal Value, ficam a “ganhar” com a medida. Em entrevista à agência Lusa, Ricardo Valente explicou que as empresas de distribuição e comércio vão “absorver directamente” um ganho que, embora marginal, deveria ser para o cliente. “As empresas de distribuição de bens alimentares vão incorporar esse diferencial do IVA na sua margem e muito poucas vão reflectir a baixa do imposto nos preços”.
No caso das grandes empresas de distribuição alimentar, o presidente da Personal Value prevê mesmo que o ganho seja “duplo”. “Estas empresas não só não reflectirão nos preços a descida do IVA, como farão certamente uso do seu poder de negociação junto dos fornecedores para obrigá-los a fazê-lo.”
Também para o secretário-geral da DECO, Jorge Morgado, muito dificilmente os preços do comércio vão baixar com a descida do IVA. E em declarações à Rádio Clube, salientava que a situação deveria propiciar campanhas de marketing para as quais lançava um alerta, lembrando que “em Portugal, não existe qualquer legislação para obrigar as empresas a baixar os preços”.
O Ministério das Finanças prometeu, contudo, quando aprovou a descida da taxa da IVA, que iria tomar medidas para assegurar que seria efectivamente aplicada pelos comerciantes. A fiscalização estaria a cargo da ASAE em parceria com a Inspecção Tributária.
A reacção da distribuição
Em dia de nova taxa, Manuel Pinho, ministro da Economia, fez uma ronda por algumas das superfícies comerciais da Sonae Distribuição, Auchan e Jerónimo Martins para “confirmar” a descida do IVA. Na maioria das superfícies comerciais, o processo de mudança do IVA foi silencioso. Algumas cadeias, no entanto, anunciaram previamente a descida dos preços e fizeram questão de a comunicar, com cartazes espalhados pela loja.
A Sonae Distribuição foi das primeiras a assumir baixar o preço de 50 mil produtos em um por cento. O processo de mudança das etiquetas demorou cerca de duas semanas, pelo que a empresa recorreu a promoções até a situação estar normalizada. Os supermercados Modelo e hipermercados Continente lançaram ainda uma oferta permanente de um por cento de desconto no cartão Modelo/Continente e ofertas temporárias de campanhas de desconto de 50 por cento em grandes marcas. A parceria com a Galp permite aos seus clientes comprar gasolina com um desconto até 10 cêntimos por litro.
O E. Leclerc Portugal arrancou com uma campanha de desconto sobre todos os produtos taxados com IVA a 20 por cento. Além da baixa de um por cento da taxa legal do IVA, a cadeia de supermercados ofereceu um desconto adicional, realizado no talão de compras, que reduziu o preço dos produtos em mais um por cento, durante todo o mês de Julho. “A campanha permite duplicar a poupança dos portugueses e reforçar o compromisso do grupo em vender tudo mais barato. É outro passo importante na satisfação dos clientes da marca”, referia Jacques de Oliveira, presidente executivo do E. Leclerc Portugal. A tomada de decisão sobre a campanha também foi apoiada pelo facto de no Verão haver um pico de vendas e de afluência às lojas. Os produtos com 20 por cento de IVA correspondem a cerca de 50 por cento do volume total de vendas das lojas. lança uma campanha em que oferece o valor do imposto aos seus clientes.
Também a Maxmat associou uma campanha à descida da taxa de IVA. Sob o mote “Oferecemos o IVA em talão”, entre os dias 1 e 31 de Julho, as lojas Maxmat ofereceram 20 por cento de desconto em talão, numa campanha que incluiu mais de 70 produtos.