As medidas tomadas para conter a propagação do novo coronavírus poderão resultar numa recessão de 8% no Produto Interno Bruto (PIB) em 2020, estima a Euler Hermes, acionista da COSEC – Companhia de Seguro de Créditos, que antecipa ainda que a economia portuguesa só deverá regressar à normalidade em 2021, depois de existir no mercado uma vacina. No cenário mais otimista, no próximo ano, o PIB pode crescer 9%.
De acordo com o cenário base elaborado para a economia portuguesa, num quadro de recuperação em “U”, este ano, o PIB deverá ficar nos -8% (face a uma média de -9,3% nos membros da zona euro) e deverá, em 2021, atingir os 9% (em linha com a média dos países da zona euro, de 9,3%). A inflação prevista para Portugal, este ano, neste cenário, é de -0,2%, e de 1,5% para 2021.
“Portugal teve menos casos de infeção e menos mortes do que outros países europeus, mas também implementou medidas que vão pesar na atividade económica este ano. A par disso, a economia portuguesa depende muito do turismo (esta atividade vale entre 18 e 20% do PIB) e tem aumentado a sua integração no comércio mundial, tendo as exportações a representar 44% da riqueza produzida pelo país (contra 31% em 2010)”, afirma Georges Dib, economista da Euler Hermes para a América Latina, Espanha e Portugal e um dos autores do estudo. “Isto significa que Portugal sofrerá um impacto significativo da forte quebra no volume de trocas internacionais (-15% esperado este ano). Embora o comércio de mercadorias deva regressar progressivamente, após o levantamento das medidas de contenção, o país será ainda mais impactado pela diminuição das viagens no longo prazo, que afetará as suas receitas turísticas”.
Pior recessão económica desde a Segunda Guerra Mundial
De acordo com o estudo “Reopening the world: Beware of false steps”, recentemente publicado pela Euler Hermes, a economia mundial vai enfrentar a pior recessão desde a Segunda Guerra Mundial, podendo o PIB atingir os -3,3%, em 2020, equivalente a uma perda de mais de 8,3 biliões de euros, ou à soma do PIB da Alemanha e do Japão. O cenário, antecipam os economistas, será mais de duas vezes pior do que o da crise financeira global de 2009.
Neste sentido, lê-se na mesma análise, só em 2020, as perdas com o abrandamento do comércio mundial poderão chegar aos 3,2 biliões de euros. Apesar dos Estados estarem a tomar medidas sem precedentes de apoio às empresas, as insolvências vão crescer pelo quarto ano consecutivo, e na ordem dos 20% (25% nos Estados Unidos, 15% na China e 19% na Europa) e o volume de negócios das empresas terá quebras de entre 30% e 40%, no segundo trimestre de 2020, em relação ao período homólogo, nomeadamente na zona euro.
Zona euro
A análise revela ainda que, só na zona euro, existem cerca de 70 milhões de trabalhadores abrangidos por medidas de desemprego parcial. Nos países onde este regime se limita a cerca de seis meses, como acontece em Portugal, Espanha, França, Itália, Bélgica ou Reino Unido, até um terço destes trabalhadores estão em risco de perder o emprego até ao final do ano, sobretudo em sectores em que o regresso à normalidade será muito lento, como hotéis e alojamento, viagens ou comércio de retalho.
Assim, estima-se que a taxa de desemprego na zona euro aumente dois pontos percentuais, para 9,5% em 2020. Espanha será o país mais afetado, com uma taxa de 18,5%. Itália deverá atingir os 11,8%, França os 10,5% e Alemanha 6%. No Reino Unido, estima-se que a taxa de desemprego quase duplique, subindo de 3,8% para 6%.
7 fatores que podem levar a uma recuperação em forma de “L”
Apesar de o cenário base ser o de uma recuperação em “U”, os analistas da Euler Hermes alertam para a possibilidade da retoma ser mais lenta e da crise se prolongar. Se for esse o caso, a contração da economia portuguesa pode situar-se nos 17%, em 2020, e nos 3%, em 2021. Nesse contexto, as estimativas de inflação são de -1% este ano e -0,1 em 2021.
O estudo elenca sete fatores que podem levar a uma recuperação em forma de “L”. Em causa estão o surgimento de uma segunda vaga do vírus, que levaria a que a economia mundial ficasse abaixo dos níveis pré-crise até ao final de 2021; a manutenção de um clima de incerteza no longo prazo, que atrasaria o investimento e aumentaria as poupanças dos consumidores, por precaução; erros políticos, como apoio insuficiente dos bancos centrais ou uma partilha desadequada dos encargos orçamentais entre os países da zona euro, que podem desencadear uma recaída e uma crise das dívidas soberanas; uma crise bancária ou do sector imobiliário, que poderia levar a um aumento muito significativo dos empréstimos de alto risco e do não pagamento por parte de empresas com dificuldades de liquidez; uma má gestão das desigualdades sociais, resultando num aumento do descontentamento das populações e em tensões políticas, sobretudo nos mercados emergentes; cadeias de abastecimento mais curtas, que conduzem a medidas protecionistas à escala global e resultam em margens de lucro estruturalmente mais baixas; e risco moral elevado (de mudança de comportamento dos agentes económicos), que pode traduzir-se num risco coletivo de maior inflação, reestruturação da dívida e aumento dos impostos.
Para evitar uma crise prolongada, os economistas consideram essencial que se assegure liquidez (a mercados, bancos e empresas) e se reforce confiança dos consumidores nas instituições.