Congresso da APDC: Criativos e marketeers discutem o futuro do marketing no universo das TIC
Carlos Coelho, fundador da Novo Design e especialista em criação e gestão, Luís Segadães, da Touch Me Wunderman, Alexandre Nilo da Fonseca, director geral de marketing do Grupo ControlInvest, Pedro Pina, presidente do McCan World Group em Portugal, e Pedro Pires, director criativo da Adore Advertising, puseram em debate o tema “Creative Downloading: As Tendências do Marketing e as TIC”. A sessão foi moderada por Carlos Oliveira, da APPM.
“Uma marca é um exercício de marcação de território, como fazer chichi num muro”. Foi desta forma que Carlos Coelho iniciou a sua intervenção, explicando depois as dificuldades para realizar tal tarefa. “Essa marcação é feita num território em constante mutação”. Carlos Coelho passou depois a apresentar o conceito do “Branding 2.0”. No passado, criar marcas passava pelo controlo da mensagem, lógica que corresponde à época em que “a marca falava e o consumidor ouvia”. Actualmente, e apesar das expectativas do uso da Internet estarem acima do mercado, 58 por cento do conteúdo objectivo das mensagens que circulam na Internet não são controladas pelas marcas, “não são mensagens corporativas”.
Para Carlos Coelho existe uma nova democracia planetária, que se traduz tanto ao nível dos conteúdos “em que qualquer pessoa pode ser emissor de conteúdos”, como ao nível da distribuição. “O controlo passou a estar de tal forma difuso que já nem os países o conseguem assegurar”. Como exemplo, Carlos Coelho apresentou o filme de Borat, que pôs o Cazaquistão no mapa.
No mundo actual, os profissionais do marketing lidam com novo consumidor. Alguém que tem “um mapa mental maior dos que as cartas do Google Earth e que produz as suas próprias mensagens, deixando de responder numa lógica de sim ou não”. Carlos Coelho afirmou ainda que a Internet permite a microsegmentação, criando redes sociais de indivíduos ávidos de participação. “No futuro vai haver uma nova Internet em que, quando utilizamos um motor de busca, passa a existir uma busca colateral que recebe ‘inputs’ sobre o nosso modo de pesquisa, personalizando os resultados”. Tudo tendo em conta a característica base do novo consumidor, a “anywhereness”, a capacidade de estar em todo o lado. “E não se trata apenas de espaço físico, mas da disponibilidade mental para ouvir e é essa disponibilidade que tem que ser conquistada”, reforçou Carlos Coelho.
Apesar das marcas não estarem ainda a actuar como deviam – só seis por cento do investimento global é canalizado para a Internet – o “branding 2.0” tem regras que não podem ser esquecidas, “ouvir em vez de controlar e, acima de tudo, partilhar”.
“Estamos claramente numa época de mudança. Mas já há 10 anos, quando abri uma agência de marketing directo, estava tudo a mudar. Aparentemente há coisas que não estão a mudar tão depressa”. De acordo com Luís Segadães, a dificuldade em acompanhar a mudança, que faz com que muitos consumidores escapem às mensagens, está, em parte, relacionada com a mentalidade reinante. “Ainda impera uma lógica de interrupção, que quer impôr a mensagem. Só que, actualmente, o consumidor tem tecnologia que lhe dá a capacidade de escapar à mensagem e vai fazê-lo”. Uma tentação cada vez maior já que, de acordo com Luís Segadães, a rejeição às mensagens aumentou na última década.
A lógica da imposição de mensagem actua como spam para o consumidor, o que resulta numa perda de eficácia da mensagem final. Luís Segadães defende uma nova forma de pensar, que vá de encontro às necessidades de cada um e lide com o consumidor de forma directa. “As companhias aéreas já o entenderam. Sabem quem são os seus passageiros frequentes e é neles que investem enviando-lhes as últimas promoções”.
O orador deu ainda o exemplo da Tesco que, no Reino Unido, criou a revista de bebés mais lida à escala nacional, usando a informação fornecida pelas clientes com filhos a cargo. Para Luís Segadães, a revolução do sector passa pela aposta no marketing relacional e o abandono da lógica de spam. “A relação entre o consumidor e uma marca não é muito diferente das relações com as pessoas que nos rodeiam”, referiu. Para comprovar a tese, apresentou estudos recentes que provam que, no longo prazo, a taxa de retenção de clientes é superior quando a estratégia seguida é a da relação segura e compensadora, deixando para trás as marcas que se limitam a “tratar bem” os consumidores.
O presidente da Associação do Comércio Electrónico em Portugal, Alexandre Nilo Fonseca, iniciou a sua intervenção, alertando para o facto de algumas empresas nacionais ainda desconhecerem as potencialidades da Internet. “A requalificação é necessária e não passa apenas pelo sector dos têxteis mas também pela gestão”, alertou. No mundo virtual deixaram de existir limites temporais, regionais ou de dimensão de empresa. “É uma realidade ‘non-stop’ que funciona 24 horas por dia, 365 dias por ano”, um universo enorme onde pequenas e grandes empresas podem funcionar em pé de igualdade, bastando para isso que se façam as adaptações tecnológicas necessárias.
À escala global, o número de internautas quadriplicou, entre 2000 e 2005, ultrapassando hoje o bilião de utilizadores. Nesse universo, o português é a oitava língua mais utilizada na Internet. O que não justifica que as empresas ignorem as restantes quando entram no mundo virtual. Além disto, no universo empresarial, “a estratégia de Internet de uma empresa não pode ficar na mão dos informáticos, passando para os departamentos de marketing e vendas”. Para Alexandre Nilo Fonseca, um país que tem o Turismo como prioridade, como é o caso de Portugal, não pode ignorar que milhares de pessoas tomam as suas decisões de viagem recorrendo apenas à Internet. O presidente da ACEP afirmou a esperança de que, com a presidência portuguesa da União Europeia, em Junho de 2007, o espírito da Estratégia de Lisboa seja recuperado. E deixou como alerta final, a mensagem que as empresas nacionais têm na Internet uma arena global para se desenvolver. “Caso não o façam outras empresas, internacionais, o farão. As estratégias de marketing têm que ser pensadas numa lógica multicanal e a Internet é um canal que funciona para a pré-venda, venda e pós-venda. Quem não está na Internet não existe”.
“As revistas de moda, beleza e turismo lembram-nos todas as coisas que deveríamos estar a fazer e não estamos”. Foi desta forma que Pedro Pina introduziu a noção de “multitasking” uma das duas grandes tendências da sociedade actual. “É humanamente impossível realizar em oito horas todas as tarefas que nos propomos fazer para ser felizes. Não há tempo, vivemos uma cultura da velocidade, em que passámos a recorrer a locais de ‘chill-out’ para descontrair”, afirmou. A segunda grande tendência que, segundo o presidente da McCan marca o momento actual, é a necessidade de pertença. “É na blogosfera que procuramos o sentido de grupo, estamos isolados, deixámos de falar com os vizinhos e não conhecemos as pessoas da rua, transferimos o sentido de grupo para a Internet”.
Numa realidade marcada pela velocidade, o recurso à Internet e aos DVD aumentou, em detrimento do recurso à televisão, que está em queda. O que reflecte a falta de tempo crónica. “As séries deixaram de ser vistas no horário de emissão, compram-se os DVD. Quando a gestão do tempo é apertada, a existência de perto de 1.800 programas de televisão diários, repartidos por mais de 90 canais (como é o caso português), gera problemas de eficácia. Está provado que apenas nove por cento dos adultos se consegue lembrar da marca anunciada na TV na noite anterior”, garantiu Pedro Pina.
A isto junta-se um novo perfil de consumidor, mais exigente, céptico e inteligente”, o que leva a que a Internet esteja a ganhar peso no investimento publicitário. “Contar histórias já deixou de ser eficaz. Hoje é a experiência que vale mais que mil palavras”. Assim, quando o consumidor assumiu para si o mundo digital, os planos de marketing têm que passar a incluir pontos tão importantes como a Internet, gaming, video on demand, marketing experiencial, comunal marketing ou branded entertaiment, de que o Rock in Rio é um dos exemplos. “Neste momento, um director de agência que não tenha um iPod devia ser demitido, porque só assim consegue saber o que se passa”.
O anúncio de 30 segundos, o preferido dos criativos, tem os dias contados. O consumidor é também produtor, as produtoras passaram a tratar directamente com o cliente. Perante este cenário tornou-se fácil acreditar que o “o digital matou a estrela criativa”, havendo mesmo quem afirme que a profissão durará apenas mais dez anos. Pedro Pires, director criativo da Adore Advertising, não acredita nestes pressupostos e explicou à plateia porquê. “O criativo transformou-se num generalista centrado num só assunto”, afirmou. Ao criativo é exigida não só a capacidade de ter ideias como de criar disrupção no próprio meio. Não lhe cabe apenas adaptar-se ao meio utilizado, como pode provocar ele mesmo alterações”.
Seguindo a tendência social que marcará todas as organizações, “o criativo tem de transcender as disciplinas e lugares técnicos na empresa”. Para Pedro Pires, de futuro, a criatividade passará a ser valorizada, dando ao criativo relevância social. Mas antes disso, ele tem de incorporar “assumidamente o artista”. Sendo ele mesmo detentor dos meios de produção, no futuro, o criativo passa a ter mais possibilidades de emprego. “A virtualidade é o ambiente ideal para os criativos”, assegurou Pedro Pires, que deu como exemplo um projecto da Adore, “creativity is everyair”, um site de viagens virtual que promove viagens que não existem, a países imaginários. “De futuro, mais do que os criativos, são as grandes estruturas que estão em risco”.