A sessão dedicada ao tema “Uma Revolução Chamada Web 2.0”, que marcou o início das reuniões paralelas no 16.º Congresso da APDC, contou com a presença de Andrew Wyckoff, director da Divisão de Informação, Computação e Políticas de Comunicação da OCDE, Carlos Liz, sócio fundador da APEME, Giuseppe Granieri, jornalista italiano especializado em meios de comunicação e cultura digital, Guivre Chafai, director adjunto do Alcatel Mobile Communication em Portugal, Nuno Artur Silva, CEO da produtora de conteúdos Produções Fictícias, e Nuno Bernardo, da BeActive, como oradores. A moderação do painel ficou a cargo de Francisco Balsemão, administrador executivo da Impresa.
A abrir a sessão, Andrew Wyckoff reflectiu sobre a evolução da Internet desde os anos 90 e o seu impacto, quer económico, através do comércio electrónico, que em 2000 era já significativo , quer na sociedade. “À redução dos preços de acesso correspondeu um aumento do número de utilizadores. Um crescimento que se reflectiu na economia. Hoje há uma massificação desse mesmo acesso. Só para dar um exemplo, todos os dias são vistos no You Tube mais de 100 milhões de vídeos”.
Segundo este responsável, o futuro da banda larga na Web 2.0 vai certamente trazer novos modelos de negócios, colocando-se aqui desafios à privacidade e à segurança do armazenamento dos dados. Entre eles, aquele orador destaca o aparecimento de novos clientes, nomeadamente da Ásia, onde o mercado está em franca ascensão, e sobretudo jovens. Devido à diminuição de barreiras no acesso, prevê-se que surjam também novos competidores.
No final da sua apresentação, Andrew Wickoff deixou bem claro que este mundo de oportunidades tem uma face negra igualmente poderosa, a criminalidade. E exemplifica com os casos de phishing, um tipo de fraude electrónica que “rouba” informações particulares, e que têm vindo a aumentar substancialmente.
O segundo interveniente deste painel, Carlos Liz, trouxe uma perspectiva nacional da adesão à revolução Web 2.0, referindo que tem havido uma série de avanços e de recuos neste processo. Entre os avanços que se têm verificado, aquele orador destacou uma nova forma de linguagem e de expressão, mais natural, fluida e dinâmica, que veio para ficar. “Trata-se de um novo sentido de pertença e de percepcionar um grupo, já que cada um é dono de uma parte do todo”. Quanto aos recuos, que Carlos Liz definiu como uma inibição ou resistência, salientou que a liberdade de não exposição, o direito à privacidade e a gestão do tempo em segurança. Outra contrariedade é o horror ao difuso, o medo que o utilizador tem de se perder num oceano de informação. “Estas pessoas têm uma visão apurada do preço do conhecimento”, exemplificou. Um último desafio consiste em manter o controlo do conhecimento e do ritmo e direcção do seu desenvolvimento.
Na sua intervenção, Giuseppe Granieri referiu que, para entender esta mudança, é mais importante saber porque funciona, do que como funciona. “Não há uma revolução propriamente dita, mas um aumento da quantidade de informação de dia para dia”. Quantidade de informação, esta, que se torna complexa e que acaba por ser uma barreira a ultrapassar.
Este jornalista focou também a importância da capacidade intelectual de cada indivíduo. Contudo, alerta para a necessidade de monitorizá-la, pois é a mesma que é aplicada na Web. Para se utilizar bem a rede, as aplicações deviam ser desenhadas à volta dos interesses das pessoas, que são o motor e a inteligência cognitiva.
Já Guive Chafai, director adjunto do Alcatel Mobile Communication em Portugal, afiança que falar de Web 2.0 é ainda um pouco ambicioso no contexto actual da Internet móvel. Contudo, considera que seria possível aplicá-la já hoje, mas que tal ainda não aconteceu devido, sobretudo, à dificuldade de criação de novos conteúdos e aos preços praticados pelo tráfego.
Este responsável salientou ainda que se abre um mundo de oportunidades, quer em conteúdos, quer em receitas, tanto para operadores como para utilizadores. Deu o exemplo de um serviço que a Alcatel está a implementar na Suíça, Alemanha e Áustria, que permite a qualquer utilizador criar os seus próprios serviços via interface web e divulgá-los, sem serem necessárias competências técnicas. “A abordagem móvel da terceira geração da Internet poderá ser ainda melhor do que a fixa”, concluiu, exemplificando, a título de curiosidade, que aquela tecnologia permite a um telespectador entrar em comunicação em directo num programa de televisão, via vídeochamada.
Para Nuno Artur Silva, CEO da produtora de conteúdos Produções Fictícias, a Web 2.0 é uma revolução completa nos conteúdos. “A televisão generalista tal como a conhecemos acabou. Os canais acabarão por ser apenas um meio de transmissão de eventos, que podem ser de desporto, entretenimento, etc”, preconiza. Para este orador, a lógica destas televisões será a da programação ao vivo ou em directo, com ou sem guião.
Outra grande transformação, apontada por Nuno Artur Silva, é a redução do poder das distribuidoras. “Este passará para as mãos dos criadores de conteúdos, que gerem tudo quanto tem a ver com a distribuição, promoção e gestão das receitas que daí advêm”. Esta mudança terá como consequência a revolução da publicidade, que perderá importância face ao marketing e este, por sua vez, tornar-se-á menos importante do que as relações públicas. “A marca será o mais importante, independentemente da forma como aparece”.
Nuno Bernardo, da BeActive, partilha da mesma opinião. Aquele orador acredita que a Web 2.0, mais do que uma revolução, deve ser vista como uma evolução. Esta alteração de paradigma implica uma mudança nos hábitos de consumo, bem como uma distribuição do entretenimento totalmente diferente da actual. “A televisão é cada vez mais uma selecção individual dos conteúdos que cada utilizador privilegia, baseada na experiência de cada um. “á não importa qual o canal que transmite este ou aquele programa, mas sim aquilo que o utilizador quer ver”. Esta situação obriga a mudanças na distribuição que colocam no centro os conteúdos. “O conteúdo reina. A marca é mais importante do que a rede de distribuição”. Neste formato, os conteúdos têm que estar disponíveis a qualquer hora, em qualquer lugar.
Contudo, antes desta transformação ser concretizada, existem algumas barreiras que é necessário derrubar. Por um lado, os utilizadores não estão muito habituados a pagar pelos conteúdos e, por outro, a noção de direitos de autor não é muito clara para todos os utilizadores e deve ser revista em matéria de legislação. Apesar disso, Nuno Bernardo acredita que, a prazo, todos estes problemas serão ultrapassados, e exemplifica com os toques para telemóveis, que “pareciam um mercado sem futuro e a realidade é hoje bem diferente”.
Neste panorama, novos desafios se colocam também aos produtores. Se no modelo anterior o financiamento dos conteúdos era maioritariamente feito pelos distribuidores, hoje são os produtores de conteúdos quem financia, vende e rentabiliza o produto. “É o produtor de conteúdos quem vai controlar toda a parte editorial e de marketing”, salientou. O ‘product placement’ em filmes, séries ou programas de televisão será cada vez mais uma realidade, pondo de lado a típica publicidade em spots.